Os impactos ambientais e sociais da cadeia produtiva da moda estão levando consumidores a buscar no consumo de roupas e outros artigos de segunda mão um aliado para exercer um comportamento de compra sustentável.
Fora do Brasil, o movimento ganhou força na Europa e nos Estados Unidos, movido pela crise financeira e reforçado pelo aumento da conscientização em relação à sustentabilidade - já que roupas e utensílios usados não demandam novos recursos naturais e energia para serem produzidos. Além disso, crescem os questionamentos de consumidores em relação às práticas trabalhistas da indústria têxtil: muitas empresas terceirizam sua produção para países onde as normas trabalhistas são mais frágeis, como China, Índia e Paquistão.
Esse questionamento ficou mais acentuado na última década, com o fenômeno da fast fashion - moda rápida, alusão à fast food, comida rápida. Nesse sistema, utilizado por redes do mundo todo, o espaço entre o desenho, a produção e a comercialização das peças é curtíssimo e mercadorias novas chegam às lojas todas as semanas, a preços acessíveis. No Brasil, redes como Zara, C&A, Renner e Marisa são expoentes da tendência. Mas muitos consumidores começam a criticar esse modelo, que estimula o consumo e o descarte de roupas.
"Os impactos da indústria da moda estão chegando ao conhecimento dos consumidores, que não querem compactuar com o uso excessivo de agrotóxicos na produção de algodão ou com o trabalho infantil na Ásia. Para essas pessoas, comprar roupas em brechós ou em lojas de segunda mão é uma solução possível", explica a antropóloga Ligia Krás, analista de tendências da empresa de pesquisas de consumo Mindset/WGSN.
Brechós
A antropóloga estuda o consumo de segunda mão ou de peças vintage há dez anos e publicou uma tese a respeito do tema, O Passado Presente: um Estudo sobre o Consumo de Roupas de Brechó, já apresentada em três congressos. Ligia analisa as diferenças culturais que estão por trás do consumo em brechós no Brasil e em países como Noruega e Inglaterra. "Nesses lugares, a compra de vestuário de segunda mão é mais motivada por caridade, já que muitos brechós são ligados a instituições filantrópicas, e pela sustentabilidade. Os brasileiros pensam em moda e exclusividade, mas isso começa a mudar", diz Ligia.
A designer Nana Soma é uma das entusiastas do consumo de roupas de segunda mão. "Comecei a me interessar pelo tema depois que fiz um curso sobre os impactos ambientais da indústria da moda. Passei a rever meus hábitos de consumo e já participei até de bazares de troca de roupas entre amigas", diz ela, que mantém um blog na internet sobre o tema moda consciente.
Apesar dos esforços, ela observa que é difícil encontrar marcas de moda realmente comprometidas com a sustentabilidade e com preços acessíveis. "O jeito é comprar roupas e acessórios no brechó, pois essa ação contribui para reduzir o impacto socioambiental da cadeia produtiva da moda", analisa.
Formada em moda, Viviane Mello, dona da marca Ecológica, que produz sacolas retornáveis em tecidos como algodão orgânico e malha de garrafas PET recicladas, também passou a comprar em brechós para reduzir sua pegada ecológica. "Evito comprar nas redes de fast fashion porque sei que existem impactos na cadeia produtiva, como a exploração da mão de obra em países subdesenvolvidos. Não quero contribuir com isso", diz Viviane, que costuma comprar roupas em brechós e reformá-las.
Glossário
Segunda mão
Artigos - de vestuário, móveis, eletrodomésticos, livros - que foram usados e que retornam ao mercado, em bazares e lojas de usados.
Vintage
Termo em inglês usado para designar itens, especialmente roupas e acessórios, de uma determinada época. No ramo da moda, são consideradas vintage roupas que são de pelo menos duas décadas atrás, ou seja, anteriores a 1990.
Fast fashion
Modo de produção que passou a dominar em redes de lojas de roupas a partir de 1990. O espaço entre desenho, produção e comercialização das peças é mais curto e mercadorias novas chegam às lojas todas as semanas, a preços acessíveis.
Por: Andrea Vialli - O Estado de S.Paulo